Àmedida que o mundo caminha para uma economia mais verde e as empresas redobram esforços para reduzir o seu impacto no planeta, surge uma nova responsabilidade nos departamentos de RH: serem promotores de práticas mais sustentáveis junto dos colaboradores.
As estratégias e políticas de sustentabilidade têm crescido rapidamente, nos últimos anos, no mundo empresarial, como resposta às questões ambientais que ameaçam o nosso planeta. O crescente papel do desenvolvimento sustentável na criação de uma vantagem competitiva nas empresas modernas tem igualmente contribuído para a incorporação de práticas mais verdes. E neste contexto também o conceito de Green Human Resources Management tem ganhado relevo.
Através da alteração dos processos críticos da área, mas também da promoção de práticas mais ecológicas e socialmente responsáveis junto dos trabalhadores, os recursos humanos têm dado o seu contributo para tornar o ambiente de trabalho e as empresas mais sensíveis ao meio ambiente, mais eficientes em termos de recursos e socialmente mais responsáveis.
Instalação de ecopontos de recolha seletiva, proibição de utilização de copos e garrafas de plástico, redução e monitorização de impressões, eficiência energética e de recursos, ou ações de voluntariado na comunidade estão entre as práticas já amplamente adotadas pelas empresas, que procuram cada vez mais diminuir a sua pegada ecológica no planeta.
No que toca aos processos de RH, as soluções passam, por exemplo, pelo recurso a processos meramente digitais durante o recrutamento e seleção, pela adoção de arquivos 100% online e pela organização de ações de sensibilização para a temática da ecologia. Mas há já quem vá mais longe e procure, por exemplo, perceber a preocupação ambiental dos candidatos antes de os contratar ou avaliar o desempenho ecológico dos seus profissionais anualmente.
Uma vantagem competitiva na atração de talento
Na L’Oréal Portugal, os RH implementaram, há já alguns anos, várias iniciativas com o objetivo de conscientizar e estimular um comportamento mais sustentável nos seus profissionais. “Estas medidas passam, por um lado, por disponibilizar aos nossos colaboradores informação sistemática sobre o tema, bem como as ferramentas para que possam ter uma menor pegada ambiental”, explica a diretora de recursos humanos Clara Trindade. No “edifício sustentável” desta empresa de cosméticos, não é permitido o uso de plástico de utilização única, os copos de plástico foram substituídos por garrafas de vidro, foram retirados os cestos individuais e colocados ecopontos em várias zonas do escritório, foi reduzido o número de impressoras, e o papel é todo reciclado. Além disso, a comunicação interna é 100% digital, e a frota de cerca de 200 carros passará toda a ser de veículos elétricos ou híbridos num futuro próximo.
A equipa de RH é o motor desta estratégia e reconhece que este tema é mais do que nunca uma vantagem competitiva no mercado. “Em muitas entrevistas, hoje, somos questionados sobre a nossa estratégia de sustentabilidade e sobre o tema da ética. Hoje os candidatos têm na equação estes temas quando escolhem uma empresa para trabalhar. Uma empresa com propósito e alinhada com os limites do planeta”, comenta a responsável.

Entre muitas outras medidas, na tecnológica Blip, foi criada uma horta com biocompostagem, que abastece a cozinha da organização, na qual os colaboradores fazem as suas refeições. “A sopa que comemos é feita com os legumes que produzimos ali”, conta orgulhosamente o senior employer brand manager Ângelo Valente, que concorda que “a gestão ‘verde’ é uma componente relevante e uma ferramenta útil na atração de talentos, uma vez que são cada vez mais os que acreditam que a sustentabilidade deve ocupar um lugar relevante no processo de gestão das empresas.”
O código de conduta organizacional da Allianz Portugal inclui como obrigação a proteção dos recursos naturais. Luís Ferreira, head of HR, acredita que, em particular para os recursos humanos, a importância de trabalhar este tema é cada vez maior, não só porque os colaboradores o valorizam cada vez mais – influenciado assim os seus níveis de motivação e satisfação -, mas também porque esta é hoje uma boa ferramenta de atração de talento. “Hoje em dia, os candidatos a emprego revelam uma curiosidade e uma preocupação sobre estes temas muito significativa, e saberem que a Allianz Portugal é uma empresa empenhada nessa questão não deixa de ser um fator de atratividade”.
Recrutar pessoas com “mentalidade ecológica”
Uma gestão de recursos humanos “verde” pode começar antes mesmo da entrada de novos colaboradores na empresa, nomeadamente, durante o processo de projetar ou aprovar, juntamente com outros departamentos, descrições de funções para os recém-chegados.
É o que acontece no Sea Life Porto, que tem procurado reduzir o seu impacto no meio ambiente, com ações claras e mensuráveis. “Uma das primeiras preocupações do departamento de recursos humanos começa no recrutamento, em que procuramos pessoas com mentalidade ecológica e com um perfil ajustado a esta temática, definindo, na descrição de função, tarefas relacionadas com a nossa política de sustentabilidade”, afirma o diretor-geral Rui Ferreira.
Os colaboradores deste aquário de acesso público são encorajados a descobrir novas oportunidades nas suas funções, para ajudar a criar processos mais sustentáveis. Como recompensa, há prémios para as melhores propostas, e noutros casos os profissionais podem realizar o carregamento dos seus veículos elétricos gratuitamente nas instalações da organização. De acordo com o responsável, “o grau de compromisso com as políticas de sustentabilidade é analisado nos planos anuais de desenvolvimento profissional de todos os colaboradores”, e o Relatório Anual de Sustentabilidade é partilhado com todas as equipas para que todos conheçam o seu contributo.
No ano passado, altura em que celebrou dez anos em Portugal, a empresa conseguiu mesmo tornar positiva a sua pegada de carbono. Foi o primeiro espaço a fazê-lo no nosso país e também o primeiro do grupo a que pertence a nível mundial.
Alertar para o tema
A cimenteira Cimpor tem um objetivo ambicioso: reduzir em 37% as emissões de CO2 até 2030. Além disso, pretende ainda aumentar a substituição de combustíveis fósseis por fontes alternativas de energia, dos atuais 30% para 70%.
Dentro dos escritórios, tem-se procurado incentivar a filosofia “Go Paperless by using Apps, Software & e-HR”, refere Filipa Drumond, diretora de recursos humanos da empresa, onde, desde 2012, se dedica um dia da Semana Interna de Prevenção de Acidentes de Trabalho a ações de sensibilização sobre sustentabilidade ambiental. “Esse trabalho em prol do ambiente é claramente uma preocupação que se estende à direção de recursos humanos. Entendemos que, para chegarmos ao nosso objetivo maior, precisamos que cada um de nós contribua ativamente no dia a dia com comportamentos sustentáveis. É essa a filosofia que tentamos incutir a todos, sem exceção, desde o início, quando se juntam à família Cimpor”, garante.
Inspirar mil milhões de pessoas, em todo o mundo, a viver uma vida em casa mais sustentável, até 2030, é o compromisso assumido pelo IKEA, que tem na sustentabilidade um pilar central do seu conceito de negócio. Segundo Cláudio Valente, HR manager da IKEA Portugal, este movimento começa com os colaboradores, “que são os melhores embaixadores” da cultura e dos valores da marca.
Logo nos processos de integração iniciais, a cadeia de retalho realiza formações sobre os procedimentos e operações que está a desenvolver para ter uma pegada ecológica positiva. No mesmo sentido, criou uma formação focada na “vida em casa mais sustentável”, que pretende ajudar os colaboradores a conhecerem comportamentos que podem adotar para terem um dia a dia mais benéfico para o planeta e, consequentemente, a sentirem-se mais inspirados para partilhar e apoiar os clientes nessa mesma descoberta. “Para todas as atividades e campanhas que desenvolvemos, temos sempre os nossos colaboradores como primeiro target e usamos essa oportunidade para reforçar mensagens e o envolvimento das pessoas”, sublinha o responsável. Neste momento, a organização prepara o lançamento de uma aplicação, onde os colaboradores podem explorar ações e comportamentos diários mais amigos do ambiente.
Políticas “paperless”
A tecnologia veio permitir que as empresas se tornem mais “paperless” – ou seja, que reduzam ao máximo o uso de papel – e a este nível os recursos humanos podem desde logo dar o exemplo. Credenciais, currículos, contratos automóveis, folhas de salário e muitos outros documentos, relativos aos profissionais de uma organização, podem ser arquivados em portais e pastas unicamente online.
Na Liberty Seguros, o combate ao papel é uma prioridade. “Em média, um colaborador de uma empresa imprime mais de dez mil folhas de papel por ano, e uma empresa com 200 colaboradores gasta em média 60 mil copos descartáveis por ano, que acabam no lixo, após uma única utilização”, alerta Beatriz Ortega, responsável pela área de employee experience. Para combater esta realidade, a empresa desenvolveu uma política “sem papel”, procurando evitar as impressões, monitorizando as que são feitas e reduzindo o número de papeleiras nos escritórios. “Hoje em dia, conseguimos arquivar todos os nossos processos e registos digitalmente, onde ficam tão ou mais seguros.”
Para Catarina Tendeiro, diretora de recursos humanos da Ageas Portugal, a digitalização é um processo exigente e complexo num setor que ainda é muito dependente de papel, mas acredita que a mudança para os novos edifícios em Lisboa e no Porto tem permitido dar um salto quantitativo e qualitativo no planeamento, e posterior implementação, de uma realidade com menos papel, menos impressões e sem arquivo físico: “O nosso processo de desmaterialização visa desenvolver novas formas de arquivo, garantindo não só desmaterialização do papel, mas também a modificação e criação de processos internos que permitam a inexistência da circulação de papel.” A executiva reforça que esta prática significa uma transformação profunda na relação com os clientes, e que é preciso investir também na formação dos colaboradores para abraçarem esta mudança.
Na sociedade de advogados Vieira de Almeida (VdA), os postos de impressão foram centralizados para um maior controlo e cuidado nos gastos que eram feitos mensalmente no escritório. José Sintra, coordenador de people strategy, partilha que nesta empresa “cada colaborador recebe um relatório mensal, no qual pode observar o seu consumo de papel e a emissão de CO2 associada a essas impressões”.
Com a mudança de escritório que ocorreu no final do ano de 2017, a VdA fez um investimento significativo no Projeto Verde, que há mais de dez anos acompanha estes temas na empresa, com o principal objetivo de mobilizar toda a organização e gerar alterações de comportamentos nos colaboradores, minimizando o impacto e a pegada ambiental da operação da firma. Aqui, todos os processos de recursos humanos já são feitos através de uma base tecnológica, desde o recrutamento e seleção à avaliação de desempenho.
Já no IKEA, a centralização das áreas de recrutamento, planificação de horários, gestão de tempo e suporte ao processamento salarial, por exemplo, permitiu reduzir cerca de 90% do papel utilizado e tornar os processos mais eficientes. “Estamos também a transformar a nossa oferta de formações numa oferta mais digital, seja em formato de apresentação, vídeos, ou até mesmo a transformação de algumas formações em videoconferências, onde conseguimos rentabilizar o tempo e os recursos para este tipo de ações”, nota Cláudio Valente.
Mobilidade verde
Para ajudar a construir uma empresa sustentável, é crucial promover eco-colaboradores que agreguem valor aos produtos e serviços da organização com a utilização eficiente dos recursos financeiros, humanos e naturais existentes.
No que diz respeito à mobilidade, os RH podem criar estratégias para incentivar a redução de emissões de carbono, através de políticas de partilha de carros, da atribuição de passes gratuitos ou com descontos, ou até da promoção de deslocações a pé ou de bicicleta. Também políticas de teletrabalho, como bem vimos durante o período de confinamento, podem contribuir para diminuir a pegada ambiental dos profissionais, com a redução das movimentações diárias para o trabalho.
José Sintra conta que na VdA, “através dos RH, é disponibilizado aos colaboradores a possibilidade de optar por benefícios de mobilidade mais sustentáveis, como scooters elétricas, lugares de estacionamento preparados para carros elétricos, ou a simples opção de requisitar uma bicicleta para transporte individual durante a hora de almoço”.
Um espaço de carpooling na intranet do grupo é a aposta da Ageas Portugal. Esta iniciativa, que permite combinar a partilha de viagens entre profissionais ao serviço da empresa, é, simultaneamente, “um importante elo agregador, não só pela dispersão geográfica entre os seis edifícios de Lisboa e Porto, bem como pela possibilidade de networking e fortalecimento das relações interpessoais”, acredita a DRH.
No caso da Liberty Seguros, existe mesmo uma recompensa monetária para quem for de bicicleta para o trabalho. Desde setembro do ano passado que a empresa paga 0,37€ por cada quilómetro percorrido desta forma pelos colaboradores entre casa e o escritório.
Criar um impacto positivo na sociedade
Cada vez mais, as organizações procuram ter impacto positivo nas comunidades em que estão inseridas, seja através de ações pontuais ou de políticas de voluntariado, de cariz ecológico ou social.
Na L’Oréal Portugal, é organizado todos os anos o “Citizen Day”, um dia em que os profissionais da empresa dedicam horas de voluntariado para ajudar uma causa social ou ambiental. “O ano passado, por exemplo, juntámo-nos à Ocean Alive para limpar lixo nas praias do estuário do Sado, tendo sido recolhidos 850 quilos de resíduos, que foram depois encaminhados para serem corretamente tratados”, refere Clara Trindade.
Na Blip são oferecidos dois dias de responsabilidade social por ano a todos os colaboradores, os quais podem ser utilizados em atividades de cariz ambiental, mas não só.
A promoção de programas de voluntariado, nas diferentes áreas geográficas onde está presente, é já uma prática bastante consolidada na Galp. No ano passado, só nas áreas de educação e energia foram feitas quase três mil horas de voluntariado. “É fundamental dar às nossas equipas a oportunidade de participar em iniciativas alinhadas com os eixos estratégicos de investimento na comunidade da empresa e da sua Fundação”, defende Sandra Aparício, da Fundação Galp e responsável de Responsabilidade Social e Corporativa da petrolífera.
São vários os casos de iniciativas de sucesso, entre os quais o Movimento Terra da Esperança, em que, com o apoio de mais de seis mil voluntários Galp, a empresa plantou cerca de 285 mil árvores, o que representa mais de 11 mil horas de voluntariado de colaboradores – o equivalente a sete pessoas em permanência o ano inteiro. “É fundamental dar aos nossos colaboradores a oportunidade de fazerem a diferença, contribuindo com o seu talento e competências”, diz a responsável, acrescentando que as verdadeiras mudanças têm de vir de dentro. “Sentimos que desta forma podemos influenciar positivamente os nossos consumidores e parceiros a contribuir para um mundo mais sustentável. Acreditamos neste efeito ‘borboleta’ que extravasa os limites da organização”, remata a responsável.